sábado, 16 de agosto de 2008

Fala sério...

Um apóstolo de Jesus inspira o novo dirigente da Senasp...

Depois de passar três meses como interino, assumiu a chefia da Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP, o senhor Ricardo Brisolla Balestreri. O novo Secretário ostenta um fulgurante currículo: educador com obras publicadas, licenciado em História, especialista em Psicopedagogia Clínica e em Terapia de Família. Integra os Comitês de Educação para Direitos Humanos e de Combate e Prevenção à Tortura no Brasil. É consultor educacional e conferencista convidado por ONGs internacionais em diversos países. Por sua atuação como educador e parceiro, foi agraciado com medalhas por diversas polícias. Por motivos óbvios, informo que essa “ficha” pode ser acessada na Internet juntamente com alguns pronunciamentos feitos pelo mesmo...

Em suas manifestações, o educador diz que sabe tudo sobre polícia... Ressalta que “pode sentar-se e discutir segurança pública com qualquer especialista policial” e que “tem conhecimento e experiência para mudar a visão tático-operacional que sempre reinou na área de segurança”. Confesso, fiquei preocupado, pois acredito naquela afirmação de que é flagrante a supremacia da excelência prática sobre a esterilidade teórica... Talvez, por isso, não sei se ele vai consertar o que critica, mas os problemas que apontou e as soluções que prega precisam ser discutidos por todos os envolvidos. Ele quer a instalação de microcâmeras nos uniformes dos policiais para “detectar abusos e violações em suas ações” e “o uso mais intenso de armas não-letais e menos truculência nas ações”. Sugere ainda um programa de tratamento psicológico para os profissionais de polícia. Diz que “a formação do policial brasileiro guarda resquícios da ditadura militar” e que muitos “apresentam dificuldades de assimilar noções de direitos humanos e valores democráticos”.

Não há dúvida de que o Secretário tem direito de externar suas idéias sobre a atividade policial até para que todos saibam o que ele pensa sobre o tema. Talvez o senhor Balestreri ache desnecessário, mas quero ajudá-lo. Em Porto Alegre, o jornal de maior circulação do Estado publicou um texto que deve interessar a ele. Uma reportagem revela que, após assistir a aulas teóricas e disparar menos de duas dezenas de tiros, a maior parte dos 563 alunos do Curso Básico de Formação Policial Militar, lotados em Porto Alegre e algumas cidades do interior, recebeu coturno, fardamento, revólver e a seguinte orientação: - Caminhem de um lado para o outro, observem o que acontece e abordem quem estiver em atitude suspeita. Parece algo óbvio, mas não é.

Um dos recrutas foi entrevistado. O diálogo estabelecido com o jornalista foi revelador e didático para quem pretende mudar as polícias brasileiras: – Não é perigoso fazer policiamento sem colete? – Imagina! A gente não conhece a cidade, não sabe atirar direito, não teve aula de abordagem e sai sem colete. Comento com o meu colega: qualquer coisa a gente corre! – Qual o principal temor de trabalhar nessas circunstâncias? – Tenho medo de morrer, é claro, mas também tenho medo de matar um inocente. – Na hipótese de prender alguém, você sabe o que fazer? – A orientação foi de prender e chamar o sargento. – Vocês possuem celular ou rádio? – Não. – Como chamam o sargento? – Boa pergunta! Não prendemos ninguém ainda, mas se prender, vou ficar esperando o oficial. O senhor não poderia levar o preso à delegacia? – Nem sei onde tem delegacia aqui por perto. – Os salários estão sendo pagos? – Não. Tenho filhos pequenos, que estão com a mulher, no Interior, e não sei o que fazer. Estou pensando em desistir. A reportagem foi bem mais extensa, mas o relatado dá uma idéia dos tempos que estamos vivendo... Com certeza alguns vão dizer que é um problema localizado - é a resposta padrão. De minha parte, só posso dizer que o fato aconteceu na cidade em que eu moro...

O novo diretor da Senasp costuma contar uma estória acontecida durante a ditadura militar. Diz que foi interrogado por um delegado de polícia querendo saber o sobrenome e o endereço de um certo “Tiago”, que seria autor de um texto considerado inaceitável na época. – “É sério delegado, esse homem morreu há muito tempo. Ele vivia em Jerusalém, no século primeiro. É Tiago, Apóstolo de Jesus, e o texto reproduzido no jornal é a ‘Epístola de Tiago’, extraída do Novo Testamento”. – “Tá me achando com cara de besta, sujeito? Nós somos polícia científica. É melhor ir dando logo o serviço”. É uma boa estória, o diretor da Senasp deixa nua a disparidade dos intelectos envolvidos numa época triste da nossa história. Tomara que o Apóstolo Tiago o inspire na implantação de mudanças que melhorem as polícias. Diferente do passado, hoje ele está num lugar estratégico para implantá-las. Existe um ministro da Justiça que acredita nele, que comunga com suas idéias e com recursos para investir na atividade policial - li que o Fundo Nacional de Segurança Pública está com menos de 8% de execução...


Finalizando, informo ao Secretário que sou um contribuinte que torce por ele. Com a vivência e a competência que tem, certamente não deve estar de acordo com o sistema perverso vigente no país, no qual os que julgam, os que acusam e os que defendem ganham – merecidamente - bons salários e dispõem de todas as condições para exercerem seus ofícios, enquanto os que estão na rua, com a difícil e perigosa missão de investigar e prender, são tratados como párias. O Secretário chega a dizer num de seus pronunciamentos que os policiais militares passam pelas pessoas nas ruas, mas não convivem com a sociedade; que não passam de vultos circulando em viaturas... Ele tem razão, a maioria deles não convive, mesmo, com a sociedade. Eles moram em moradias humildes, distantes, esmagados por salários miseráveis, alguns escondendo suas fardas para não serem mortos.

Volto à reportagem do jornal... O Secretário, um intelectual festejado, educador e militante de organizações que defendem os direitos humanos, certamente fará o que estiver ao seu alcance para que não sejam jogados na rua policiais despreparados, com medo de matar inocentes - o que fatalmente acaba acontecendo. Gente que, como é revelado no jornal, está com vontade de desistir por não conseguir sustentar suas famílias. Essas e outras mazelas precisam ser mudadas. Um país como uma das maiores economias do mundo, que investiu milhões de dólares para organizar um Pan-americano e que pretende investir ainda mais para sediar uma Copa do Mundo e uma Olimpíada, com certeza encontrará uma maneira de investir, também, na segurança do seu povo.

Texto de Valacir Marques Gonçalves

Um comentário:

Anônimo disse...

O que acontece em São Paulo é o que ocorre em todo o país! Leiam este texto:

"ENTENDA PORQUE VOCÊ NÃO TEM SEGURANÇA"

Como Delegado de Polícia do Rio de Janeiro é meu dever moral e jurídico esclarecer ao povo carioca os motivos pelos quais enfrentamos este caos na Segurança Pública. Em primeiro lugar, fique você sabendo que a nossa legislação permite que qualquer pessoa, independentemente de sua qualificação profissional, assuma o cargo de Secretário de Segurança Pública. Isto significa que as Polícias Militar e Civil estão sob a direção de pessoas que nem sempre têm qualquer conhecimento jurídico e operacional para exercer sua função pública. Isto significa também que o Governador eleito pelo povo indica o Comandante da Polícia Militar e o chefe de Polícia Civil, que podem ser demitidos a qualquer momento. Estes por sua vez, indicam os comandantes de cada Batalhão e os Delegados Titulares de cada Delegacia, que por sua vez, são também afastados de seus cargos por qualquer motivo. Digo, portanto, que a Polícia Civil é absolutamente política e serve aos interesses políticos dos que foram eleitos pelo povo. Quando os afastamentos de Delegados são políticos e não motivados por sua competência jurídica e operacional, o resultado é a total falta de profissionalismo no exercício da função. Este é o primeiro indício de como a nossa Lei trata a Polícia. Se a Polícia é política quem investiga os políticos? Você sabia que o papel da Polícia Militar é exclusivamente o patrulhamento ostensivo das nossas ruas? E por isso é a Polícia que anda fardada e caracterizada e deve mostrar sua presença ostensiva, dando-nos a sensação de segurança. Você sabia que o papel da Polícia Civil é investigar os crimes ocorridos, colhendo todos os elementos de autoria e materialidade e que o destinatário desta investigação é o Promotor de Justiça que, por sua vez, os levará ao Juiz de Direito que os julgará, absolvendo ou condenando? Então, por que nossos governadores compram viaturas caracterizadas para a sua polícia investigativa? Então, por que mandam a Polícia Civil patrulhar as ruas e não investigar crimes? Parece piada de muito mau gosto, mas é a mais pura e cristalina realidade. Você sabia que o Poder Judiciário e o Ministério Público são independentes da Política e a Polícia Civil é absolutamente dependente? Assim, a Polícia Civil é uma das bases que sustenta todo o nosso sistema criminal, juntamente com o Judiciário e o Ministério Público. Se os Delegados de Polícia têm essa tamanha importância, por que são administrativamente subordinados à Secretaria de Segurança e a Governadores que são políticos? Porque ter o comando administrativo da Polícia Civil de alguma forma serve aos seus próprios objetivos políticos, que passam muito longe dos objetivos jurídicos e de Segurança Pública. Assim, quero dizer que o controle da Polícia Civil está na mão da política, isto é, do Poder Executivo. Tais políticos controlam um dos tripés do sistema criminal, o que gera prejuízos tremendos e muita impunidade. Não é preciso ser inteligente para saber que sem independência não se investiga livremente. É por isso que os americanos criaram agências de investigação independentes para fomentar sua investigação criminal. Em segundo lugar, fique você sabendo que os policiais civis e militares ganham um salário famélico. Você arriscaria sua vida por um salário de fome? Que tipo de qualidade e competência têm esses policiais? Se a segurança pública é tão importante, por que não pagamos aos nossos policiais salários dignos, tais quais são os dos Agentes Federais? Se o Governo não tem dinheiro para remunerar bem quem é importante para nós, para que teria dinheiro? Em minha opinião, há três tipos de policiais: os que são absolutamente corrompidos; os que oscilam entre a honestidade e a corrupção e os que são honestos. Estes trabalham em no mínimo três "bicos" ou estudam para sair da polícia de cabeça erguida. De qual dessas categorias você gostou mais? Parece que com esses salários, nossos governantes, há tempos, fomentam a existência das primeira e segunda categorias. É isto o que você quer paraa sua cidade? - Mas é isso que nós temos! É a realidade mais pura e cristalina! O que vejo hoje são procedimentos paliativos de segurança pública destinados à mídia e com fins eleitoreiros, pois são elaborados por políticos. Mas então, o que fazer? – Devemos adotar uma política de segurança a longo prazo. A legislação deve conferir independência funcional e financeira à Polícia Civil com seu chefe eleito por uma lista tríplice como é no Judiciário e no Ministério Público. A Polícia Civil deve ser duramente fiscalizada pelo Ministério Público que deverá também formar uma forte Corregedoria. O salário dos policiais deverá ser imediatamente triplicado e organizado um sério plano de carreira. Digo sempre que se a população soubesse qual a importância do salário para quem exerce a função policial, haveria greve geral para remunerar melhor a polícia. Mas a quem interessa que o policial ali da esquina ganhe muito bem? - Será que ele vai aceitar um "cafezinho" para não me multar ou para soltar meu filho surpreendido com drogas? Será que não é por isso também que não temos segurança? Fiquem todos sabendo que se o policial receber um salário digno não mais haverá escalas de plantão e, conseqüentemente, não haverá espaço físico para que todos trabalhem todo dia, como deve ser. Fiquem sabendo que a "indústria da segurança privada" se tornará pública, como deve ser. Fiquem sabendo também que quem vai ao jornal defendendo legalização de emprego privado para policiais, não deseja segurança pública e sim, segurança para quem pode pagar. Desafio à comunidade social e jurídica a escrever sobre estes temas e procurar uma POLÍTICA DE SEGURANÇA realmente séria e não hipócrita, como é a que estamos assistindo Brasil afora.

AUTORIZO A PUBLICAÇÃO IRRESTRITA DESTE TEXTO.
Façam um favor ao Estado do Rio de Janeiro, enviem para todas as pessoas que conhecerem / Dr. TARCÍSIO ANDRÉAS JANSEN - DELEGADO DE POLÍCIA”